Com a sua tendência para absorver e centralizar tudo em si, o MPLA trata muitas vezes o nacionalismo angolano como se fosse exclusivo seu. Não é, de facto. Houve três grandes líderes e muitos mais participantes da luta (não só militar) pela independência. Todos eles, naquele momento pelo menos, foram nacionalistas angolanos.
Com a sua tendência, típica dos partidos únicos marxistas, o MPLA provoca reações que, no entanto, são muitas vezes desencontradas e mal formuladas, pois os seus protagonistas reagem com raiva descontrolada, mas compreensível, ou com segundas intenções, por exemplo a de usar a discussão para demarcar novos territórios e expulsar do panteão nacionalistas que não é por estarem lá que têm de sair.
O mais preocupante é a confusão terminológica, infelizmente comum quando o sistema escolar entra em colapso e não há sistema tradicional que o substitua. Tentarei discutir essa confusão e esclarecê-la.
Em primeiro lugar, ouço falar em nacionalismo moderno angolano. Houve outro? Angolano houve outro? O nacionalismo angolano foi a resposta ao colonialismo moderno. Foi esse colonialismo, definido a partir da Conferência de Berlim, que impôs a administração e ocupação efetiva de todo o território reivindicado ou distribuídos pelas e às potências coloniais. Essa expansão da administração colonial efetiva, conjugada com a definição de fronteiras fixas, trouxe o mapa das novas nações africanas. O nacionalismo foi a resposta dos filhos dessas novas realidades político-geográficas à agressão colonial. Essa resposta caracterizou-se, entre outros aspetos, pela aceitação das fronteiras coloniais e consequente reivindicação da independências das colónias. Não pode, portanto, haver nacionalismo antes de estarem definidas e fixadas essas colónias, bem como devidamente constituídas a partir da ocupação e administração efetiva de todo o seu território pela potência colonizadora.
É neste sentido que só há nacionalismo angolano moderno, o que não significa só haver nacionalismo do MPLA. Mesmo antes da criação da UNITA, por exemplo, havia nacionalistas do Centro e Leste do país que não eram do MPLA.
Alguns amigos reclamam que a data para o começo do nacionalismo deve recuar até à data do começo da colonização, naturalmente pensando nas chefias tradicionais que reagiram à ocupação do seu território pelos portugueses e seus aliados. É preciso fazermos aqui a destrinça entre nacionalismo e resistência ao colonialismo. A rainha Nzinga ou Jinga Mbandi, ou o Ngola Kilwanji, ou o Ekuikui, ou o D. António do Kongo (o Manimulaza das crónicas coloniais), eram contra a dominação portuguesa. Nessa medida, podem ser considerados nacionalistas, mas nacionalistas relativamente à sua nação, não eram nacionalistas angolanos, porque Angola não existia nessa altura como se fosse uma nação, como um território cujos filhos ansiavam pela independência. Havia o reino do Ngola e uma pequena colónia junto ao litoral que também se chamava Angola. A resistência aos portugueses era em defesa das nações pré- e para-coloniais, no sentido em que usamos o termo (na verdade, sempre que um povo invade, conquista e ocupa o território do outro temos colonialismo e, portanto, a nossa história foi toda colonial, não era preciso esperar a chegada dos portugueses para falar em colonialismo).
É também neste sentido que não considero correto chamar nacionalistas angolanos os que lutavam pela sua nação histórica, particular, antes de haver nação angolana, já reunida, lutando por si. Esquecermo-nos disto é, não só falta de rigor conceptual, é perigoso para o futuro de Angola, não somente para a visão do passado. Esquecermo-nos disto é confundirmos as parcelas com a totalidade e, em política, o passo logo a seguir a esse é o de cada parcela reivindicar o seu direito ao controlo da totalidade.